Embora Kardec não fosse um cientista por profissão, ligado a um ramo específico das ciências, era detentor de um “espírito científico”, pois nele estavam contidas todas as condições indispensáveis ao ofício: 1) Serenidade para com os fatos mediúnicos, não negava nem afirmava em princípio; 2) Domínio próprio para não se entusiasmar com os primeiros resultados; 3) Cuidado na seleção das comunicações; 4) Prudência nas declarações, para evitar divulgações precipitadas de fatos ainda não examinados e comprovados e; 5) Humildade para buscar a verdade antes e acima de tudo.
O Espiritismo e a Ciência não são forças antagônicas, mas ao contrário, completam-se mutuamente. A Ciência, propriamente dita, tem por objeto o estudo das leis do princípio material, enquanto que o Espiritismo tem por objeto o conhecimento das leis do princípio espiritual e, como este é uma das forças da natureza que reage sobre o princípio material, o conhecimento de um não está completo sem o conhecimento do outro. Nesse sentido, observa-se que a Ciência sem o Espiritismo não pode explicar certos fenômenos valendo-se apenas das leis materiais. Na mesma linha, o Espiritismo sem a Ciência torna-se vazio de apoio e comprovação.
No processo de codificação do Espiritismo, Allan Kardec utilizou o método experimental, semelhantemente ao usado pelas ciências positivas. Tal metodologia fundamentava-se na observação, comparação, análise sistemática e conclusão. Não havia teoria preconcebida acerca da existência dos Espíritos e outros princípios da doutrina, tendo a concepção destas ocorrido somente após a observação e constatação dos fatos. Em outras palavras, não foi a observação dos fatos que resultou na confirmação de uma teoria do Espiritismo, mas a teoria surgiu somente após a verificação dos fatos, cujo objetivo era a explicação destes. Portanto, o Espiritismo é uma ciência de observação, e não um produto da imaginação do homem.[1]
No exercício do método experimental, procurava remontar os efeitos às causas por meio da dedução e do encadeamento lógico dos fatos, só admitindo uma explicação como válida quando ela resolvia todas as dificuldades do problema, tendo sempre procedido desta forma em seus trabalhos anteriores. Conquanto Kardec tenha utilizado para tecer os primeiros fundamentos da Doutrina Espírita o método indutivo, observando exemplos diferentes para tirar uma conclusão geral, não deixou de usar, também, o chamado processo dedutivo, raciocínio pelo qual se tira conclusões por meio de premissas dadas, uma vez que os processos científicos exigem a combinação de ambos.
Aspecto de fundamental importância no tocante ao método de codificação da Doutrina é o que chamamos de controle universal dos ensinos dos Espíritos, caracterizada por dois importantes aspectos: A generalidade ou universalidade dos ensinos, que têm validade universal, tendo Deus incumbido os Espíritos de os levar de um canto a outro do planeta, manifestando-se por toda parte; a concordância dos ensinos, pois se serviram de grande número de médiuns estranhos uns aos outros e em vários lugares, mas todos concordantes com os ensinos.
Retomando o tema em A Gênese, Kardec ensina que a generalidade e a concordância no ensino são o caráter essencial da Doutrina, a condição mesma da sua existência, resultando daí que todo princípio que ainda não tenha recebido a consagração do controle da generalidade não pode ser considerado parte integrante da mesma doutrina, sendo sempre uma opinião isolada, não podendo o Espiritismo assumir a responsabilidade.
A opinião concordante dos Espíritos, examinadas pela lógica, constitui a força da Doutrina Espírita, assegurando-lhe perpetuidade. Para que ela mudasse, a universalidade dos Espíritos precisaria alterar sua opinião, dizendo o inverso, pois que ela tem sua fonte no ensino dos Espíritos e, para que sucumbisse, seria necessário que os Espíritos deixassem de existir.[2]
Assim, observa-se ter Kardec compreendido em seu íntimo a gravidade dos fenômenos que estava disposto a observar, e a forma como estes poderiam revolucionar as ideias e as crenças. Por conta disto, procurou agir com bastante circunspecção, sendo positivista e não idealista, para não se deixar contaminar por ilusões.
[1]KARDEC, Allan. A Gênese. 53 ed.Brasília: FEB, 2013. p. 22. [2]KARDEC, Allan. A Gênese. 48. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2005. p. 11.